6 de abril de 2021

PARÁ - PROCURADOR ESTADUAL É CHAMADO DE 171, PROCESSA E PERDE NA JUSTIÇA

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Benedito Wilson Sá foi alvo de Gilberto Martins por criticar sua gestão à frente do MP paraense, onde não teria cumprido promessas

Autor: Ana Célia Pinheiro

Benedito justificou dizendo que apenas criticava a administração de “enganação” 
do procurador. Gilberto Martins (na direita) alegou ter sido “atingido em 
sua honra”, mas TJ não aceitou justificativa
| Oswaldo Forte/ Ag Belém - Divulgação/MPPA

O Procurador-Geral de Justiça (PGJ), Gilberto Martins, sofreu mais uma derrota: o Tribunal de Justiça do Estado (TJ-PA) concedeu Habeas Corpus para trancar um Procedimento de Investigação Criminal (PIC), aberto pelo Ministério Público do Pará (MP-PA), a pedido de Gilberto, contra o promotor Benedito Wilson Correa de Sá. Em um grupo fechado de WhatsApp, Benedito criticou a gestão do atual PGJ, que comanda há quatro anos o MP-PA, classificando-a como “171”, numa referência ao artigo do Código Penal que trata do crime de estelionato. Gilberto alegou ter sido atingido em sua honra. Mas o TJE entendeu que tais declarações não configuram crime: foram apenas críticas administrativas. A decisão foi unânime, embora com a suspeição declarada por quatro desembargadores.

“Em nenhum momento eu quis atingi-lo pessoalmente, nem agredi-lo como membro da instituição”, disse Benedito, ontem, ao DIÁRIO. “Na realidade, emiti apenas e tão somente um conceito sobre a forma como ele vem administrando o Ministério Público. E isso me faculta a própria Constituição, é o direito à livre expressão. Isso não é e nunca foi crime”. Ele afirmou que ao se referir ao “171” não quis chamar Gilberto de estelionatário: “O que eu quis dizer é que a administração dele é só roupagem, enganação, porque ele chegou ao cargo com um discurso, mas nada fez do que dizia”.

Também salientou que as pessoas que se candidatam a um cargo público, como é o caso do PGJ (que é nomeado pelo governador a partir de uma lista tríplice votada pelos integrantes do MP), estão sujeitas “à vigilância dos jurisdicionados”. Benedito também responde a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) porque, em uma ocasião anterior, teria usado “termos chulos” ao criticar Gilberto, a quem classificou como o pior PGJ da história da instituição.

O processo do HC está sob sigilo. Mas o DIÁRIO apurou que as afirmações sobre o 171 que seria a administração de Gilberto ocorreram em um grupo fechado de WhatsApp chamado “Agricolinos80”, que é composto por ex-alunos da Escola Agrotécnica de Castanhal, que se formaram em 1980. Nele, há agricultores, fazendeiros, indigenistas, técnicos agrícolas, de vários estados da Amazônia. Mas o único ex-aluno da área Jurídica seria Benedito. Daí não se saber exatamente como Gilberto teve acesso a essa conversa. Nos autos processuais, disse uma fonte, constaria inclusive um pedido de diligências que Benedito teria feito, ao longo do PIC, para identificar a fonte dessa informação ao PGJ, mas o pedido teria sido negado. Ontem, o promotor não confirmou nem negou essas informações ao DIÁRIO. Limitou-se a repetir que nunca teve a intenção de ofender Gilberto pessoalmente.

Segundo o relator do HC, o desembargador Leonam Gondim da Cruz Junior, o PIC foi instaurado pelo procurador de Justiça Jorge Rocha, Corregedor do MP-PA, quando se encontrava substituindo Gilberto na função de PGJ, em julho do ano passado. O procedimento seria para apurar uma denúncia de que Benedito teria cometido crimes contra a honra de Gilberto (difamação e injúria), em um áudio divulgado, em 13 de abril do ano passado, em um grupo de WhatsApp. Nele, Benedito teria dito que Gilberto, enquanto administrador do MP, era “um chulo” e “171”, não tendo cumprido as promessas de campanha. Ainda segundo o relatório do desembargador, Benedito disse, em juízo, que Gilberto não teria revelado como conseguiu esse áudio, para que se pudesse “aferir a legalidade da obtenção da prova em que se apoia todo o procedimento investigatório”. Benedito sustentou, ainda, que suas críticas foram apenas à forma como Gilberto exerce o cargo de PGJ; que estava sendo submetido a uma coação ilegal, e que teve ofendido o seu direito à liberdade de expressão.

CONTEXTO

Em seu voto, Leonam Gondim disse que criticar alguém, chamando-o de chulo, grosseiro, não se enquadra no crime de difamação previsto no Código Penal. Para isso, seria preciso a imputação de um fato “determinado, individualizado, identificado, e não de defeitos ou de qualidades”. Ele observou a necessidade de levar em conta o contexto de uma conversa, “pois se referir a uma pessoa, como é recorrente no dia a dia, chamando-a de ‘171’, é dizer que tal pessoa é promesseira, falaciosa, como no caso dos autos, que o paciente (Benedito) teria dito que na administração do ofendido (Gilberto) ele não cumpriu o que prometeu na campanha para ascender ao cargo (...)”. Quer dizer: não teria havido a imputação a Gilberto do crime de estelionato.

O mesmo entendimento teve o magistrado, quanto ao enquadramento das declarações de Benedito no crime de injúria: para que isso ocorresse, seria preciso “a vontade livre, deliberada e consciente de ofender a dignidade e o decoro, atingindo à honra pessoal, subjetiva da vítima (...)”, e não uma simples crítica administrativa. Ele reforçou que é preciso analisar o contexto em que as coisas são ditas. E para ele, emitir opiniões informais em um grupo restrito de WhatsApp, acerca da administração de um gestor público do órgão em que se trabalha “não me parece querer atingir sua honra pessoal e são situações que, não raro, ocorrem em qualquer lugar”. Além disso, observou ainda, “aquele que coloca o seu nome à disposição de um cargo eletivo para administrar uma instituição pública a gerir um bem público, fica sujeito a críticas, pois por mais que o gestor pretenda fazer o melhor, vai ter sempre alguém que discorde e ele vai ter que conviver com isso”.
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