CV e Família do Norte exploram nova rota de tráfico de maconha na Amazônia
Leandro Prazeres* Do UOL, em Brasília
As facções criminosas Comando Vermelho (CV) e FDN (Família do Norte) estão explorando uma nova rota para o tráfico de maconha para o Brasil. Essa rota utiliza os rios Japurá, Içá e Negro, que interligam a Colômbia e a Venezuela ao Brasil. O novo caminho foi a alternativa encontrada pelas duas facções para lidar com o "bloqueio" imposto pelo PCC (Primeiro Comando da Capital) à maconha do Paraguai, maior produtor da droga. A nova rota é monitorada pela pela Polícia Federal e pelas Forças Armadas.
O Estado do Amazonas é um conhecido "corredor" para o escoamento de cocaína. A chamada "rota do Solimões", com mais de 20 anos de utilização, é uma das principais portas de entrada da cocaína produzida no Peru e na Colômbia. A região, agora, se transformou em um importante canal para a entrada de maconha produzida, principalmente, na Colômbia.
As investigações em curso sobre a nova rota indicam que a droga é produzida na região de fronteira entre o Brasil e a Colômbia e escoada pelos rios Japurá (conhecido na Colômbia como Caquetá), Içá e Negro.
O rio Negro, que liga o Brasil à Venezuela, se conecta com o Japurá por meio dos chamados "furos", canais naturais que surgem, principalmente, durante a época de cheia dos rios amazônicos. O aumento no fluxo de transporte da maconha colombiana em direção ao Brasil resultou no aumento das apreensões da droga neste ano. No mês de janeiro, o Exército apreendeu 5,3 toneladas de maconha do tipo "skunk" na região de fronteira entre Brasil, Colômbia e Venezuela.
O volume é, segundo o Exército, maior que tudo o que os militares apreenderam na região em todo o ano passado. Em uma dessas apreensões, houve troca de tiros com traficantes e pelo menos cinco militares ficaram feridos. O comandante militar da Amazônia, general Antônio Miotto, disse que a tendência é que haja aumento no número de confrontos entre militares e narcotraficantes na região. "Nossa análise de risco diz que podem ocorrer [mais confronto [mais confrontos]", disse à reportagem.
Comando Vermelho e FDN exploram nova rota
Uma pessoa das forças de segurança pública que atua na região ouvida pela reportagem sob a condição de anonimato confirmou que a rota vem sendo explorada pela FDN e pelo Comando Vermelho. Historicamente, o Paraguai vem sendo o maior fornecedor de maconha para o mercado brasileiro. Segundo a pessoa ouvida pela reportagem, a maconha colombiana se transformou na alternativa do CV, aliado da FDN, para conseguir acesso à droga depois que o PCC dominou a rota paraguaia.
Em junho de 2016, o traficante brasileiro Jorge Rafaat foi morto em uma emboscada na fronteira entre o Brasil e o Paraguai. A execução de Rafaat foi planejada pelo PCC e pelo CV, mas a morte do traficante se transformou no estopim para uma "guerra" entre as duas facções. O PCC, que antes atuava em conjunto com o CV na exploração da rota paraguaia do tráfico de drogas, passou a dominar, sozinho, esse corredor. Isso aumentou a pressão sobre o CV para buscar uma nova rota de acesso à maconha.
"Depois que o PCC matou o [Jorge] Rafaat [em 2016], o CV ficou praticamente sem acesso à maconha paraguaia, que é de ótima qualidade comparada com a produzida no Nordeste brasileiro, por exemplo. A saída foi comprar maconha na Colômbia. Eles precisam fazer caixa. E quem tem o controle das rotas nessa região é a FDN", disse o entrevistado ligado às forças de segurança pública.
Segundo o entrevistado, a nova rota da maconha começou a ser utilizada há pouco mais de cinco anos, mas o fluxo por ela só se intensificou ao longo de 2017. A maconha colombiana, segundo a fonte, abastece hoje os mercados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
O aumento na utilização da rota amazônica para a entrada da maconha colombiana no Brasil coincide com a redução da demanda pela droga no mercado norte-americano. Atualmente, 29 dos 50 Estados norte-americanos legalizaram ou descriminalizaram o uso da maconha para fins medicinais ou recreativos.
Essa política teria feito cair o fluxo de maconha oriunda da Colômbia em direção aos Estados Unidos. Segundo dados do governo norte-americano, o número de apreensões de maconha na fronteira entre o México e os EUA caiu 24% entre 2011 e 2014.
Considerada de alta qualidade, a maconha colombiana chega a ser vendida no mercado brasileiro por um valor até oito vezes mais alto do que a paraguaia.
Rota surge em meio a conflitos no PCC e crise para o CV
A exploração da nova rota se intensifica em um momento de crise do PCC, principal rival do Comando Vermelho e da FDN. Na última quinta-feira (15), Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, foi morto a tiros no Ceará. Ele era apontado como o principal líder do PCC fora dos presídios e o terceiro na hierarquia geral do PCC.
Gegê do Mangue |
Moradores da área indígena onde Gegê foi morto afirmam que um helicóptero teria sido usado para disparar tiros contra ele. Uma das linhas de investigação é que ele tenha sido morto como parte de uma represália imposta pela alta cúpula do PCC depois que Gegê ordenou a morte do ex-integrante da facção Edílson Borges Nogueira, o Birosca, antigo aliado de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola.
Para o Comando Vermelho, o momento também é de preocupação. Depois de perder acesso à rota paraguaia de maconha e cocaína para o PCC, o CV poderá sofrer com a intervenção federal na Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro decretada pelo presidente Michel Temer (MDB). Apesar de atuar em quase todo o Brasil, o CV ainda é fortemente baseado no Rio de Janeiro.